Quando chegou ao lar de Salvaterra de Magos pelas mãos de dois militares da GNR, Manuel Neves, 78 anos, tinha as unhas tão grandes que enrolavam, a barba tapava-lhe o pescoço e a roupa estava impregnada com urina. Nos últimos 14 anos, a sua reforma foi gasta por um filho e pela nora e a sua liberdade limitada a um barracão trancado a cadeado. O caso chegou a tribunal, mas o casal suspeito esteve sempre em liberdade e acabou condenado a uma pena suspensa.
Sentado no sofá, Manuel "Patalinho", como era conhecido na freguesia de Granho, chora cada vez que lhe perguntam pelo passado. Sabe que faz anos a 10 de Agosto, mas já não se lembra quantos. E quando lhe perguntam pelos filhos não segura as lágrimas. "Os filhos deviam ter mais amor aos pais. Não imagina como ele chegou aqui", recorda ao DN o provedor do lar Armando Oliveira.
Manuel foi resgatado em Dezembro de 2006 de um barracão, guardado por um rotweiller, onde ninguém conseguia entrar, na freguesia de Granho. Ao fim-de-semana, o filho, acusado de sequestro, levava-lhe latas de feijão e salsichas. O idoso aquecia-as "com uma luz" e fazia as necessidades "por ali", recorda.
Adelaide Baptista, prima do idoso, disse ao DN que a situação agravou-se em 2004, quando o filho mais novo foi trabalhar para Espanha. "Antes ele cuidava dele e eu tinha uma chave. O mais velho mudou a fechadura e eu deixei de o ver. Mas ouvia os gritos de aflição", diz à porta da casa que fica a mais de 300 metros do local onde Manuel viveu anos sob sequestro.
Foram os gritos que levaram os vizinhos a queixarem-se à Junta de Freguesia e, mais tarde, à GNR. As queixas de que Manuel vivia em condições precárias e num sofrimento atroz chegaram em Junho desse ano, mas a solução só apareceu seis meses depois.
"A adaptação ao lar foi difícil. Ele não sabia onde fazer as necessidades. Vinha com muita fome. Hoje já sabe e é muito sossegado", diz a técnica responsável, Ana Guilherme. Mas chora muito. "Deve ser o seu estado depressivo".
O filho mais novo ainda o visita de vez em quando. O mais velho e a mulher, constituídos arguidos no dia em que Manuel foi resgatado, não mais deram notícias.
O casal foi libertado, mas acusado de sequestro do idoso a quem gastavam a reforma, de cerca de 200 euros/mês - do seu trabalho enquanto funcionário da EPAL.
Há um ano, no tribunal, os militares da GNR e as técnicas da Segurança Social recordaram ao juiz como encontraram o idoso. O casal acabou por ser condenado. Ele a três anos e nove meses de prisão - pena suspensa pelo mesmo período - e ela a dois anos e dez meses, igualmente suspensos. Nunca estiveram atrás das grades.
Os filhos puseram agora a fazenda do idoso à venda. "Não o trataram e agora querem vender-lhe os bens", critica o provedor.
"Como é possível isto acontecer em pleno século XXI?", interroga Adelaide, das únicas visitas de Manuel, que assim que viu o caso de Coruche ser noticiado - em que uma idosa e o filho deficiente viveram em condições semelhantes - se lembrou do seu primo.
in DN online, 06-9-2009
Uma vergonha!!! 14 anos a violarem a integridade física de uma pessoa e têm pena suspensa??? Que país!!! Que família!!!
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